A imunidade tributária dos jornais digitais – JE Camargo
Conforme amplamente noticiado pela mídia, o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu recentemente que os livros digitais (e os suportes próprios para sua leitura e armazenamento) têm imunidade tributária. Entendemos, porém, que a decisão no RE 330.817 (com repercussão geral) apresenta uma amplitude maior do que se tem noticiado, já que tratou do próprio alcance da imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “d”, da Constituição Federal, valendo ser verificada sua aplicação para outras disputas ainda indefinidas sobre esse tema macro.
O julgamento do leading case se baseou na combinação das interpretações histórica, teleológica e evolutiva do instituto da imunidade, destacando-se que, se assim não fosse, correr-se-ia o risco de se esvaziá-lo por mero lapso temporal e evolução tecnológica. Esse aspecto deve guiar todas as disputas cuja pretensão seja a de mitigar regras imunizantes tão somente pelas inovação criadas no tempo.
Nota-se que o Ministro Dias Toffoli fez uma profunda digressão histórica resgatando julgados sobre o alcance da imunidade tributária desde antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, trazendo à luz questões como a sua aplicação à transmissão de anúncios e propaganda via empresas jornalísticas[1] (para desonerar o preço de venda do periódico e garantir a sua veiculação), às listas telefônicas (dada a sua utilidade social e caráter informativo)[2], bem como a sua não aplicação à calendários (que se assemelham à mercadoria mais do que manifestação cultural e/ou de pensamento). Destacou também precedentes do período pós Constituição de 1988, como a aplicação da imunidade a encartes e capas para livros didáticos distribuídos em fascículos semanais de jornais[3], apostilas[4], mapas impressos e atlas geográficos e, ainda, a álbuns de figurinhas[5] que estimulariam “o público infantil a se familiarizar com meios de comunicação impressos”.
A partir desses exemplos de julgados e também da análise sobre a evolução da comunicação ao longo dos tempos da humanidade, buscou-se evidenciar que a imunidade buscaria proteger valores sociais “caros” ao povo brasileiro, precipuamente, a liberdade de expressão e comunicação, bem como a disseminação do pensamento e da cultura; enaltecendo-se a importância do conteúdo do “objeto” da imunidade ser de clara utilidade pública e apto a disseminar os valores sociais e culturais referidos, despiciendo qual a sua forma de apresentação: se em papel ou qualquer outro meio que refletisse o avanço tecnológico.
Dito isso, tal raciocínio firmado pelo STF no julgamento do RE 330.817 em sede de repercussão geral extrapola os limites da discussão da tributação dos e-books e seus acessórios, alcançando situações análogas, como por exemplo dos jornais, que hoje também são divulgados em meios eletrônicos, devendo-lhes ser destinados tratamento idêntico, isto é: de prevalência da sua intributabilidade, afastando-se a pretensão fazendária de cobrança de imposto inclusive sobre a inserção de material publicitário nesses veículos de comunicação digital, já que isso não ocorre nos jornais em papel, em respeito à cultura de precedentes sedimentada pelo Novo Código de Processo Civil.
————————————- [1] RE 87.409/SP, DJ de 1º.9.1978..
[2] RE 101.441/RS, DJ de 19.8.1988.
[3] RE 225.955/RS, DJ de 26.2.1999.
[4] RE 183.403/SP, DJ de 4.5.2001.
[5] RE 221.239/SP, DJ de 6.8.2004.
Luiz Roberto Peroba Barbosa – Advogado em São Paulo